Sentimentos antagônicos, conflituosos, difíceis de equilibrar. Acentuados pela incerteza e pelos efeitos da medicação. Fragilidade? Sim. Medo e vulnerabilidade? Sim. Pena de si? Não, por favor. Coragem para enfrentar? Sim. Força? Às vezes, sim. Outras, não. Apoio e compreensão? Sempre, por favor.
– A dualidade de sentimentos é complicada. As pessoas querem que tu ajas com se fosses uma rocha, em um momento de extrema fragilidade – pondera a empresária e educadora Maria da Graça Flach, ou Chica, como todos carinhosamente conhecem esta minha ex-professora de Inglês que passou por um segundo diagnóstico e tratamento de câncer de mama.
Às vésperas de fazer uma mastectomia, ao ser questionada se estaria preparada para a cirurgia que removeria totalmente as mamas, Chica desabou e chorou diante da difícil situação. E logo viu sua reação ser sentenciada e interpretada:
– Você não está pronta. É claro o seu desejo de não fazer a intervenção cirúrgica – lhe disseram.
– É óbvio que eu não quero me operar – replicou ela – Que pessoa de sã consciência gostaria? É uma mutilação no corpo. Mas o meu bom senso me diz que eu vou. Então, eu vou. Mas não me peçam para estar saltitante feito uma gazelinha – contrapôs, irônica.
Com sua resposta, Chica expõe uma dificuldade que o doente de câncer enfrenta junto a quem lhes acompanha – médicos, familiares, amigos, afetos. O manejo psicológico é, ainda, a parte mais complicada e de difícil compreensão para quem está próximo. É preciso, sim, incentivo para que a pessoa recuse o papel vítima e encontre forças, confirma minha ex-professora. Mas isso não significa exigir papel de rocha do doente. Nem voto de silêncio quanto ao câncer em si.
– Deixa eu ter meus momentos de choro, faz parte – instiga Chica – Há momentos em que me sinto enfraquecida e isso não me faz uma pobrezinha, porque eu não sou. Mas também não sou pedra.
Isso talvez seja difícil, pondera a empresária, porque quem está em torno fica extremamente fragilizado, em especial os familiares. E, também, porque ainda há muito tabu e preconceito diante da doença. Segundo me conta Chica, o desconforto é tamanho que as pessoas fogem da simples menção da palavra, como se câncer fosse a nova lepra ou o capeta em pessoa. Mas abolir a palavra câncer do dicionário ou evitar pronunciá-la, como se fosse contagiosa por simples menção, de nada adianta. Pelo contrário. Para ela, só reforça o medo e o universo de sentimentos a ele conectados. Tanto de quem vive, como de quem acompanha de perto a doença.
Texto escrito no Outubro Rosa de 2014.
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PS: A imagem que ilustra este post integrou a campanha de conscientização ao câncer de mama desenvolvida pela agência DDB Maputo, de Moçambique, para a Associação da Luta Contra o Câncer (ALCC) em 2011. Nela, heroínas como Mulher Maravilha e a vilã Mulher Gato fazendo o autoexame da mama, em ilustrações criadas por Maisa Chaves.