Pra mim, a vida poderia ser traduzida em cores.
Minhas primeiras e mais sutis impressões de tudo que está ao meu redor podem ser traduzidas nos mais diversos tons. O entusiasmo que sinto transbordar em meu corpo quando estou feliz é azul, anil como céu de inverno em dia de muito sol e sem nuvens. A monotonia, por sua vez, é pálida como o cinza e o chumbo.
Dias tristes me lembram um verde desmaiado, asfixiado e sem vida pela quase ausência de cor. Se colocar mais pigmento nesse tom, chego ao verde água e encontro sinônimo para calma e paz, sentimentos que me invadem quando meus olhos se fixam e se perdem em mares cristalinos.
É também através de cores que registro minhas impressões de lugares, pessoas, viagens e músicas. A Linha 28, por exemplo. uma localidade no interior de Gramado, no meio do Vale do Quilombo. Um lugar que me remete ao conforto e à segurança do marrom que é terra, ao pé no chão, o ser acolhido de braços abertos, ao conforto de sempre ter para onde voltar. O despir-se, vulnerabilizar-ser e tão somente e simplesmente ser.
Viajando mais longe, penso em New York. Pra mim, a cidade é um espectro de cores, tamanha diversidade de credos, culturas e personas de diferentes backgrounds que ali convivem em democrática harmonia. Os endereços nobres do Upper East Side são tão elegantes e clean quanto é a combinação do branco com o prata, por exemplo. Já andar pelas ruas do Village em sua criatividade visceral e pulsante me faz pensar na intensidade do púrpura e do escarlate.
Aliás, este intenso vermelho ainda me faz pensar em poder, e imediatamente associo cor e conceito tanto aos bispos e cardeais da Igreja Católica como a momentos inspirados, apaixonados e avassaladores, por amor ou por ódio. Da mesma forma, também o verde me transmite emoções absolutamente opostas. Se o tom é claro e aguado, propaga calma; no entanto, se de tão escuro quase beira o preto, então expressa raiva e derivados tais como ciúme, inveja, frustração e ressentimento. Todos eles sentimentos que enrijecem a alma.
Pensando nisso tudo, me ocorre que o equilíbrio da vida não está na tendenciosa monocromia do pensamento unilateral; mas sim, na alegre policromia de uma visão de mundo que abraça e acolhe a diversidade. Porque viver é exatamente alternância e coexistência – de cores, de ritmos, de movimentos, de ciclos, de tudo que é e há nesse mundão lindo. E que nada, mas nada mesmo, pode ser mais pobre, triste e seco do que uma vida monocromática. Seja ela no tom que for.
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