Era uma vez um jovem casal que sonhava velejar mares e cruzar oceanos. Aos vinte e alguns anos, Márcio e Alessandra Machemer compraram seu primeiro barco e passaram a testar as águas navegando no Guaíba, em Porto Alegre. Tempos depois, estenderam as velas e a rota, seguindo rumo a Florianópolis e São Francisco do Sul.
Apesar da vontade de ir além ser grande, eles ainda eram muito apegados à terra e ao que tinham. Sentimento que só cresceu com a chegada de Henrique, o primogênito do casal.
– Eu não me sentia preparada – recorda Alessandra.
O medo de deixar tudo pra trás acabou ganhando a queda de braço com o chamado à aventura, quando o casal e o pequeno Henrique viveram um incidente que não só estragou o barco deles, mas também arranhou o sonho de velejar. Com o forte prejuízo emocional e material, venderam o veleiro e compraram um sítio em Nova Santa Rita, pequeno município da grande Porto Alegre.
Nos anos que se seguiram, investiram energia na terra e nessa proposta de vida, com direito a horta orgânica, forno, cachorros (Alessandra era então veterinária), piscina, e muitas reuniões de família e com amigos. Foi no sítio que chegou a segunda filha do casal, Carolina. E logo depois dela, a vontade de voltar a velejar.
Em 2009, começaram a procurar por um novo veleiro. Olharam e olharam barcos em diversos lugares. Mas era no Jangadeiros, o clube do casal em Porto Alegre, que estava o sonho de consumo da dupla: o Aruna. Sem muita convicção devido ao pouco dinheiro que tinham, fizeram ao então proprietário do barco uma proposta que eles chamavam de ‘indecente’. Uma que, para surpresa e alegria deles, o dono do veleiro topou.

O universo conspira!
Assim, em 2010, a família tinha, outra vez, um veleiro pra chamar de seu. E o sonho comum de navegar mundo afora pra compartilhar. Um ano depois, Marcio, que é piloto, tirou uma licença não remunerada e usou esse tempo para acompanhar uma reforma no veleiro. Enquanto isso, Alessandra começava sua formação em Yoga. No final daquele mesmo ano, o casal e os filhos passariam navegando nas águas de Angra dos Reis e Paraty, no Rio de Janeiro. E os cinco meses que ali permaneceram serviria como um ensaio para a aventura maior que viria depois.
– A família voltou diferente, depois de passar 24 horas por dia, sete dias por semana, o tempo inteiro junto – conta Alessandra.
O capitão Márcio retornou para a aviação, já com a ideia de começar a trabalhar e viabilizar o projeto maior sonhado há tanto tempo. Alessandra, por sua vez, fechou a clínica veterinária que tinha e passou a se dedicar integralmente às aulas de Yoga.
Cinco anos depois, Márcio tiraria uma nova licença não remunerada para começar a desenhar o projeto da viagem em família. O primeiro passo foi trocar o Aruna, que não tinha condições de acompanhar a família na nova aventura. Depois de muita pesquisa e negociações em que o universo conspirou a favor, eles acabaram optando por comprar um catamarã novinho em folha de um fabricante francês.
– No Brasil não havia o tamanho que precisávamos – explica Alessandra.
Paralelamente, eles foram cuidando de todos os demais detalhes. Conseguiram quem cuidasse dos cachorros e do sítio. Doaram muitas coisas, mantiveram outras e selecionaram apenas o básico pra levar. Carol foi matriculada em uma escola que lhe habilita seguir seus estudos em alto-mar. E Henrique, que finalizara o ensino médio e fora aprovado em Letras na UFRGS, trancou a matrícula pra iniciar a faculdade após seu retorno.
Assim, no dia 23 de janeiro de 2018, o casal e os filhos embarcava para a França, indo ao encontro do catamarã comprado. Duas semanas depois, no dia 08 de fevereiro, recebiam o Biguá, nome dado ao novo e tão desejado barco. E assim se iniciava a aventura de navegar em família pelo mar Mediterrâneo e atravessar o Oceano Atlântico. O sonho de duas décadas começava a se concretizar.

Uma família desbravando mares.
A aventura da família no Biguá se iniciou na França, passou por Portugal, Espanha e Itália antes de seguir para as ilhas Canárias, de onde partiram numa regata que cruzou o Oceano Atlântico. No final de dezembro, a família aportou em Santa Lucia, no Caribe, aonde vem navegando desde então entre praias de tirar o fôlego, águas cristalinas e paisagens inóspitas. Aventuras essas que você pode acompanhar no instagram @veleirobigua e também no Canal deles no Youtube e no Facebook.
A viagem já rendeu muitas memórias, vivências e experiências incríveis para a tripulação do Biguá. Mas nesses mais de 500 dias de barco, o maior aprendizado e aventura tem sido a convivência contínua em um espaço tão pequeno.
– Esse tempo juntos valeu mais que qualquer terapia familiar – diz Alessandra.
Mas além da convivência 24/7 da família, outro grande aprendizado foi lidar com a expectativa. Das mais elaboradas às mais corriqueiras situações, como a alimentação, por exemplo.
– É comprar na feira o que tiver e é isso. Sem sofrimento. Na França, encontramos produtos orgânicos. Na Espanha, não tinha. É o que a casa oferece!
Para ela, além de evitar decepção, não ter expectativas permite descobrir os lugares.
– Cada lugar é único, tem sua personalidade – conta Alessandra – Você vai entendendo ele, aprendendo suas peculiaridades, os comportamentos, as características do clima, o jeito que esse lugar funciona, e o que você precisa fazer diferente. O bacana da viagem é que tu fazes isso a toda hora!
Outra lição vinda com a limitação de espaço imposta pelo barco foi o fim do desejo de consumir e comprar tudo que agrade aos olhos a cada novo lugar que visitam – e olha que já foram mais de 100 ancoragens!

Também a prática de Yoga de Alessandra precisou ser adaptada nessa viagem. Se as posturas em si já são desafiantes em terra firme, imagine fazê-las sobre um tapete em constante balanço sobre as ondas. Além de adaptar alguns ásanas, outros ela precisou deixar de fazer em alguns momentos – como as posturas invertidas e de equilíbrio, durante a travessia do Oceano Atlântico.
– Tive que aprender a aceitar que algumas coisas não podem ser feitas em um barco se movendo. Está sendo um grande aprendizado – reafirma Alessandra.
A família tem ainda mais cinco meses e algumas novas ancoragens programadas, antes de regressar ao Brasil, em setembro. Porém, um novo sonho, que pode levar o Biguá e sua tripulação para outros mares e oceanos, já desponta e começa a ser navegado na imaginação e desenhado no papel. Por aqui, já aguardo as novas aventuras dessa inspiradora família. Enquanto isso, vou acompanhando essa trupe incrível nos canais do Veleiro Biguá, que compartilho abaixo.
“Talvez você tenha um sonho que considere impossível. Queríamos dizer que quando o sonho é verdadeiro, e a vontade é enorme ( a ponto de deixar confortos, de abrir mão de coisas muito importantes) tudo é possível”.
Família Veleiro Biguá

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