Era uma vez, um vento que trazia liberdade. Num determinado verão, numa determinada cidade, ele tocou a alma de André, um jovem atormentado por um segredo que considerava pesado e complicado demais. Mas nessa tarde de brisa morna, tocado pela leveza desse sopro de transformação, ele botou pra fora.
– Sou gay
Assim revelava o jovem, aliviado por tirar tamanho peso de seus ombros, lembrando as dezenas de vezes em que havia forçado a barra, ora querendo disfarçar sua homossexualidade na frente dos amigos, ora tentando negar a si mesmo.
Como fora difícil!
Porres homéricos em festas, para poder embalar, na sequência, a noitada com alguma garota em qualquer motel da cidade. E, assim, esconder dos amigos suas preferências, sua essência. Ouvir calado os comentários maldosos que rolavam entre os amigos, dizendo que ele estava no armário. Sim, ele havia cansado disso tudo. Queria dar um basta, se libertar! E, então, resolveu assumir.
– Sou gay – disse André, olhando para a amiga Carla, que estampava nada ais do que uma cara de paisagem, sentada na sua frente, antes de esboçar um sorriso sincero e responder.
– André, isso eu já sabia. Só respeitava teu silêncio.
Na verdade, Carla desconfiava há algum tempo. A certeza só não vinha pelo comportamento macho, que ela não entendia, do amigo nas festas. Na turma, rolavam vários comentários sobre André. Um dia, uma amiga garantiu “de fonte segura” que ele era gay. Chateada, Carla defendeu a masculinidade do amigo com veemência. “Ora, ora, que maldade”, sentenciou. E agora, ali estava André, sentado a sua frente, confirmando tudo, num misto de alívio e ansiedade.
Era compreensível entender tanto desconforto. Não era fácil levantar e dizer em alto e bom tom isso.
Carla sabia que seu amigo guardava em tons vívidos na memória as piadas e chacotas dos colegas de aula na infância. E ele bem que havia tentado gostar do universo masculino. Mas, a cada nova tentativa, era rechaçado. Toda vez que se candidatava a jogar futebol, era expulso do time pelos meninos. “Vai brincar com as gurias, seu fresco”, berravam os moleques. Isso só aumentava sua sensação de exclusão e revolta. Sim, ele até preferia estar com as meninas, mas sentia-se culpado por isso. E, então, forçava uma aproximação com os garotos. E era desprezado.
Que nó na cabeça, pensou Carla, enquanto ouvia as histórias de André.
Curiosa, ela perguntou se ele estava namorando.
– Sim – foi a resposta.
Fora o namorado que encorajara André a se libertar e revelar sua homossexualidade. Ele vivia um momento que mesclava êxtase e culpa, mas, definitivamente, era uma fase de alívio para sua alma, atordoada até então. Como consequência, seu corpo mudou, também. E muitos dos males que André sofria, desapareceram de sua vida. E seu espírito… Ah, seu estado de espírito! Tornou-se mais leve, divertido e tranquilo.
Livre, enfim!
NA VIBRAÇÃO DE URANO, O REVOLUCIONÁRIO
Esta história foi escrita no final de 2003 na vibração de Urano, o planeta dos ventos e descargas elétricas, das tempestades que varre e sopra pra bem longe tudo que não é autêntico e verdadeiramente da pessoa. E liberta do que oprime! O revolucionário que luta contra as desigualdades e a tirania da opressão – seja ela qual for. E cujo lema é viver – com coragem, verdade e liberdade – quem somos genuinamente!